Quem é que nunca ouviu falar da
história de Pinóquio, o garoto-boneco narigudo de madeira? Dentre as crianças –
ou ao menos quando eu era criança – a história de Pinóquio é o exemplo de menino
mentiroso. Quanto mais mentia, seu nariz vegetal crescia. Talvez não seja
incomum vermos professoras de ensino fundamental dizendo aos pequenos que tomem
cuidado para que seus narizes não cresçam, em analogia à mentira.
A verdade, queiramos ou não, é que
somos todos pinóquios – em maior ou menor grau. Vez ou outra caímos na mentira.
Uns mais, outros menos; intencionalmente ou não. Isso, porém, não deve ser
motivo para não buscarmos agir com honestidade e espírito verdadeiro.
O que alguns talvez não saibam é que
a inversão quanto à mentira é mais antiga do que a era cristã. Moisés, há mais
de três mil anos, recebeu o decálogo (ou Dez Mandamentos) dado pelo próprio
Deus. Dentre as ordens, o nono mandamento é “não dirás falso testemunho”.
Muitos pensam que isto implica em apenas não mentir, mas não é apenas isso.
O Catecismo de Heidelberg, em sua
pergunta de número 112, diz: “O que se exige no nono mandamento?”. A resposta
dada pelo próprio catecismo é:
Que
eu não devo levantar falso testemunho contra ninguém, nem distorcer as palavras
de ninguém, não fazer fofoca nem difamar, não condenar nem me ajuntar com
ninguém para condenar a outrem precipitadamente e sem o ter ouvido. Antes devo
repudiar toda mentira e engano, obras próprias do diabo, para não trazer sobre
mim a pesada ira de Deus. No tribunal ou em qualquer outro lugar eu devo amar a
verdade, dizê-la e confessá-la com honestidade e fazer tudo o que puder para
defender e promover a honra e a reputação do meu próximo.[1]
Como dito no Catecismo citado acima,
cumprir o mandamento não é apenas evitar a mentira, mas muito além disso. Kevin
DeYoung nos diz:
Alguma
vez você já disse uma meia verdade sobre alguém? Alguma vez você deu falso
testemunho do caráter ou das ideias de alguém? Se assim for, você quebrou o
nono mandamento. [2]
Dizer meias verdades também é
mentir. Ser desonesto ou algo do gênero nos faz iguais a mentirosos. Corremos o
risco de emitir uma versão diante de algo, omitindo algumas partes ou
distorcendo outras. Não dar a descrição honesta de algo é caracterizado por
mentira. O Salmo 40.4 nos diz: “Bem-aventurado o homem que põe no Senhor a sua confiança e não pende para
os arrogantes, nem para os afeiçoados à mentira”.
O catecismo nos diz, ainda, que não
devemos fazer fofoca. Fofocar é dizer algo sem fundamentação ou, ainda,
divulgar segredos de alguém[3]. Desastres podem ser
provocados por fofocas ou especulações sem embasamento. Casamentos podem ser
prejudicados. Pessoas, mortas. Vidas, arruinadas. Carreiras, destroçadas. Tudo
isso por uma simples especulação. Provérbios 26.28 nos diz: “A língua falsa
aborrece a quem feriu, e a boca lisonjeira é causa de ruína.”.
É necessário entender que uma fofoca
não é apenas algo errado, mas também dizer algo desnecessário. Paulo nos diz: “Não
saia da vossa boca nenhuma palavra torpe, e sim unicamente a que for boa
para edificação, conforme a necessidade, e, assim, transmita graça aos que
ouvem” (Ef 4.29).
Outro problema é o julgar. Como
seria bom se todos buscassem informações confiáveis sobre algo ou alguém antes
de julgar. Aliás, ainda mais importante: buscar saber se isso ou aquilo de fato
aconteceu. Muitos julgam os demais sem qualquer precaução. Sem buscar
informações. Jesus Cristo nos diz: “Não julguem, para que vocês não sejam
julgados.
Pois da mesma forma que julgarem, vocês serão julgados; e a medida que usarem, também será usada para medir vocês.” (Mt 7.1-2, NVI). A falta de amor leva algumas pessoas a não se colocarem no lugar do próximo.
Pois da mesma forma que julgarem, vocês serão julgados; e a medida que usarem, também será usada para medir vocês.” (Mt 7.1-2, NVI). A falta de amor leva algumas pessoas a não se colocarem no lugar do próximo.
É importante lembrar, antes de
qualquer coisa, que o que nos é proibido não é o julgar, mas julgar
indevidamente. Nós precisamos analisar tudo e reter o que é bom, como dissera
Paulo. Muitas pessoas, carismáticos principalmente, se escondem atrás do “não
julgueis” como desculpa para cometer pecados e saírem ilesos de situações.
Lembro-me de certa ocasião em que, ao criticar um pastor neopentecostal, uma
amiga me disse: não se deve falar mal de um pastor, ele é ungido de Deus. A
questão da expressão “ungido de Deus” é assunto para outro momento, mas o foco
é: precisamos avaliar tudo.
Precisamos, ainda, fugir “toda
mentira e engano”. Uma razão prática para isso é que o pai da mentira é Satanás
(Jo 8.44). DeYoung nos diz:
As
palavras “todo tipo” realmente me apertam. Quantas vezes distorcemos as nossas
histórias só um pouquinho, exagerando a quantidade de neve que caiu, ou quanto
tempo estudamos, ou quão rápido corremos? Eu me peguei querendo distorcer a
hora em que me levanto pela manhã, só para dar impressão de um melhor
rendimento do meu dia.[4]
É necessário policiar-se, para que
nossa natureza pecaminosa não nos faça pecar. Podemos, algumas vezes, mentir
para nós mesmos e acreditar em nossa própria mentira. Quando mentimos, honramos
o pai errado[5].
Outra forma de desobedecer o
mandamento é ser conivente com injustiças. O catecismo diz que precisamos “fazer
tudo o que puder para defender e promover a honra e a reputação do meu próximo”.
Arruinar o nome de uma pessoa publicamente ou contribuir injustamente com seu
declínio é ser conivente. O amor ao próximo, dentre outras situações, deve se também
aplicar aqui[6].
O Catecismo Maior de Westminster, em
sua pergunta 145, nos diz quais são os pecados proibidos no nono mandamento. Um
comentarista nos resume, dizendo que são: difamação, julgamento falso, pleitear
em favor de causas más, covardia, caluniar e maldizer, discriminar[7].
Resumindo:
O ocultamento ou falseamento da verdade, o falso testemunho, o perjúrio e a
detração são ofensas a Deus pela quebra do nono mandamento, opróbrios aos
eleitos e ignomínia diante do santíssimo tribunal divino.[8]
Que possamos viver de acordo com a
vontade do Senhor para as nossas vidas, sendo verdadeiros e honestos.
[1] CATECISMO DE HEIDELBERG. Dia do Senhor 43. Disponível em:
<http://www.heidelberg-catechism.com/pt/lords-days/43.html>. Acesso em 02
abr. 2015.
[2]
DeYOUNG, Kevin L. As boas novas que quase
esquecemos. São Paulo: Cultura Cristã, 2013. p. 192.
[3] Dicionário Online de Português. Significado de Fofoca. Disponível em:
<http://www.dicio.com.br/fofoca_2/>. Acesso em 02 abr. 2015.
[4]
DeYOUNG, Kevin L. As boas novas que quase
esquecemos. São Paulo: Cultura Cristã, 2013. p. 193.
[5]
Ibid. p. 194.
[6]
Ibid.
[7] FIGUEIREDO,
Onézio. Catecismo Maior de Westminster. Catecismo
Maior de Westminster. Disponível em: <http://www.ipalimeira.com.br/files/Catecismo-Maior-de-Westminster.pdf>.
Acesso em 04 abr. 2015. p. 228-229.
[8]
Ibid. p. 229.
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